Há cheiros férteis e intensos que voltam a ti embora o campo esteja ermo e já nada renasça na primavera. Há um arrecendo a tabaco nas rugas das mãos do avó doce anos depois. E uma música que ressoa agora que na casa já não fica nem corrente eléctrica. Memória. Aos poucos o tempo vai aumentando cara atrás e adoras essa sensação de nostalgia. Há uma plenitude de coração nessa olhada reconciliada. Por fim reconciliada. Saudosa não do tempo que se foi mas sim da lentidão.
Apenas lamentas um bocadinho que, enquanto o tempo se estica atrás de ti, vai-se encolhendo por diante. Lamentas um bocadinho que demores tanto em aprender agora que resta pouco.
As verdadeiras crises sempre levam a um nascimento. Poderia dizer: as verdadeiras crises sempre levam a um renascimento. Mas não acredito. As crises, as de verdade, fazem-te nascer de novo. Nada importa que o corpo seja o mesmo, que os pegadas na areia se repitam, que movas a mesma quantidade de ár ao caminhar. Nada importa. A pessoa que és agora é outra. Às vezes mesmo gostas mais da recém nascida, com as suas rugas na pele e as marcas das derrotas novas, e uma lasca mais na olhada para contar. Os cowboys faziam lascas das mortes dos outros, nada de mao em fazer lascas das mortes próprias.
A maior diferença de cada nascimento é o tamanho: cada vez és mais pequenina.