Não é preciso estar em todas as situações do mundo para conhecer a sua música, para saber dos movimentos, do ritmo do coração. Pode que nunca fosses abandonada, mas a desolação que sentes em domingos de chuva com os telefones silenciados pertence à mesma melodia. Talvez não tenhas sentido a paixão amorosa que linda com o esquecimento, mas a alegria que sentes apenas por olhar um rosto, o nervosismo dos minutos antes de encontrá-lo, as estupidezes ditas como se fossem as únicas verdades possíveis fazem parte da mesma sintonia. O abraço dum menino ao que acabas de oferecer uma larpeirada tem o tremor do agradecemento filial. Sim, não é preciso experimentá-lo tudo. Apenas ter o ouvido atento e o coração aberto.
Para o resto das cousas, para as que é impossível compartir, para as que não tenhem nome, para as que não deveriam exisitr, respeito.
Contra a fealdade o prazer. Porque a vida já é suficientemente complexa e os acontecementos sucedem sem necessidade de ajudá-los. Porque as desgraças nunca venhem sós (sabedoria popular). Por isso, dança comigo até o fim do amor, abraça-me não como se fosse esta noite a última vez mas como se fosse a única. Não me contes agora a dor. Vamos deixar que a música se acabe e a pele transpire as tristezas. Vamos ficar colados enquanto dure. Vamos fazer que a Terra não pare, que continue a girar apesar. Vamos perpetuar a dança como quem perpetua uma espécie, como quem acredita na salvação. Contra a tristeza o prazer.
Cada dia novo, sem clasificações nem medidas. O prazer. A descoberta. Viver de novo cada repetição como se não tivesse existido nunca. Primeiras vezes cada dia, em cada olhada, em cada morango com sumo ou cada copo de vinho. Tudo na vida deveria ser uma descoberta. Até as repetições.