Estou tentada de cair, dizer tudo aquilo de que para o 2009 saúde e desejos cumpridos. Tenho tentações de cair nos tópicos, de lembrar-me das amigas que me lem e das que não o fão. Das que estão, estiverão ou estarão. Lembrar-me das ausências embora façam tanto dano. Estou tentada de enviar-vos mensagens em que vos diga o muito que vos quero e tudo o bom que tedes.
Mas a tentação mais grande é a de deixá-lo estar, nada do que vos possa dizer neste dia será tão fermoso como ter-vos ao meu lado.
Para o 2009, que estejades aí.
O que tenho: uma grande gaveta dentro duma mesa de cabeceira. Abre-se de vez em quando para deixar entrar visitantes e objectos novos, que se movem sem ordem nem controlo. As outras gavetas desta mesa de cabeceira estão igualmente habitadas, abrem-se da mesma maneira e os seus ruídos contaminão a minha. Ao nosso arredor, outras gavetas, outras mesas de cabeceira, outros armários...
Mas alguma vez volto à casa de dimensões naturais. De vez em quando posso escutar a lenha que arde na cozinha, um corvo distante que reclama o seu alimento, um silêncio gigante interrumpido umas poucas veces pola prosaicidade dum frigorífico que começa a funcionar. Um tempo enorme que se estira e se estira permitindo aborrecer-me. E sobretudo, muito espaço limpo e calmo na minha cabeça.
Marcas físicas: olheiras,talvez um pouco mais de gordura arredor da cintura, os olhos ligeiramente vermelhos e um pouco de congestão nasal.
Os sintomas não significam nada, gripe, catarro, uma noite de insónia... Mas o burato abismal entre a minha consciência e o mundo, esse, é inequívoco. Um abismo que devo saltar, quase cada dia, sem ajuda de paraquedas. Há dias em que encontro o valor para fazê-lo, e a cada passo que dou fabrico uma ponte baixo os pés. Outros dias, outros como hoje, só vejo a escuridão.